ADVOGADO IMOBILIÁRIO - O MUNDO É REDONDO
O MUNDO É REDONDO!
Antonio Carlos de Paula |
Esta frase é de conhecimento público e todos os dias em algum lugar, e por formas às vezes inusitadas, alguém tem a oportunidade de confirmar a sua veracidade, costumo usar uma outra frase que tem o mesmo escopo, “aja com as pessoas, como gostaria que elas agissem com você”!
No final de Janeiro deste ano fui procurado por uma cliente que havia comprado um apartamento em Novembro do ano passado, alias o imóvel era para um parente dela.
O valor era de 850 mil reais, e como o imóvel ainda não havia sido transmitido formalmente para vendedora havia uma despesa de escritura por volta de 25 mil reais, que foi embutida no preço, assim o valor final passou para 875 mil reais, na realidade minha cliente teria que arcar com as custas de duas escrituras.
A entrada foi acordada em 350 mil reais, e o saldo seria através de financiamento, é claro que se ela estivesse assessorada por um corretor e ou por um advogado, jamais teria comprado nessas condições de pagamento, um sinal muito alto, e com tais pendencias de documentação. Foi convencionado um prazo de 15 dias para apresentação da documentação regularizada, e, de 30 dias para assinatura da escritura ou contrato de alienação junto ao agente financeiro.
A alta dos juros logo no começo do ano inviabilizou a possibilidade de obtenção de financiamento no valor do saldo, em contato com a vendedora para explicar o ocorrido e tentar resolver a situação, a mesma foi taxativa, queria o cumprimento do contrato, ou a compradora perderia o valor do sinal.
Esta era a situação da encrenca quando fui procurado. Quando analisei então o contrato soube que cláusula que estipulava o prazo de 10 dias para entrega dos documentos pessoais e do imóvel, ainda não havia sido cumprida, isso após 60 dias da assinatura do compromisso de venda e compra.
Notifiquei então a vendedora para rescisão do contrato, com a devolução integral do valor recebido como sinal e principio de pagamento, com fulcro na inadimplência da cláusula pertinente a documentação.
Só fui conseguir falar com a vendedora dez dias após a mesma ter sido notificada que informou que o seu advogado entraria em contato.
A minha cliente me fornecera o telefone do advogado, e como já havia cansado de esperar entrei em contato com ele.
Meu colega foi seco e taxativo dizendo que sua cliente concordava em rescindir o contrato e devolver metade do valor do sinal, o que era realmente um verdadeiro absurdo. Ponderei que a vendedora que alegava ter usado o valor para fazer reforma em um imóvel, havia recebido o valor, agora já há noventa dias, e que se ela tivesse utilizado um empréstimo bancário para bancar a tal reforma teria pago juros na ordem de dez por cento ao mês.
Em resumo, a vendedora recebeu 350 mil reais há noventa dias atrás, usou como bem quis, lucrou pois não pagou um tostão de juros, e agora queria devolver metade pura e simples do valor recebido. Confirmei com minha cliente que entraria com a ação, no entanto, não poderia afirmar que ela ganharia a causa, apesar de ter convicção e argumentos para isso, nem quanto tempo iria demorar.
Fui então informado que parte do dinheiro que ela havia pago como entrada da compra do imóvel havia sido obtida por empréstimo bancário e ela precisava resolver logo a pendência pois os juros estavam exorbitantes.
Ela preferia perder parte do que já havia pago pois senão teria que continuar a pagar os juros bancários, e com a incerteza de vitória na ação, e a certeza da demora dos tramites processuais a emenda ficaria pior que o soneto, e portanto, ela aceitaria a devolução de apenas 200 mil reais só para se livrar do problema.
O dinheiro era dela mas eu tinha obrigação de alertá-la e de tentar minimizar seu prejuízo, consegui convencê-la a ter um pouco de paciência e me dar uns dias para conseguir ao menos uma devolução de 250 mil reais, com o que ela acabou concordando.
Comecei então a negociar com o colega até chegarmos ao valor de 300 mil reais a ser devolvido por sua cliente. Após dois dias ele me retornou concordando e ficou de preparar a minuta da rescisão. Só foi me enviar a minuta quatro dias depois isso após eu haver ligado inúmeras vezes cobrando.
Quando recebi a minuta o sangue ferveu, constava a devolução de 300 mil reais em três parcelas de 100 mil reais cada uma. É mesmo pra ficar “purificado” da vida! Adoro ser feito de idiota e era exatamente o que estava acontecendo.
Novos telefonemas, novas mensagens, e o mesmo estresse, só que em maior dose. O colega alegou que sua cliente não tinha o valor para pagar a vista, que tinha um comprador para o imóvel e que só poderia pagar desta forma.
Por fim conseguimos acertar a devolução em uma parcela de 100 mil reais e uma de 200 mil em trinta dias.
Retifiquei então a minuta da rescisão que ele havia me enviado e coloquei uma cláusula em que os pagamentos seriam feitos através de cheques que deveriam ser entregues pela vendedora no ato da assinatura, um para o ato e o outro para ser depositado em trinta dias.
A quitação se daria obviamente após a quitação dos mesmos e na hipótese de não pagamento de qualquer um deles no dia do vencimento acarretaria à vendedora o ônus de pagar o valor do(s) cheque(s) devolvido(s) acrescido do valor retido pela vendedora à título de indenização (50 mil reais), além de juros, correção monetária e multa estipulada em 10% sobre o total.
O primeiro cheque foi pago normalmente, quatro dias antes do vencimento do cheque de 200 mil, o colega me liga. O atual comprador do imóvel havia solicitado as certidões dos antecessores da vendedora, lembrem-se que quando da transação feita em Novembro 2014, ela ainda não tinha a escritura em seu nome.
Ocorre que a vendedora havia recebido o imóvel em permuta feita com uma construtora.
Como o registro da escritura era recente, ela só passou para o nome dela quando recebeu a grana da minha cliente, e é mais que sabido que salvo raríssimas exceções sempre existem ações contra construtoras.
Era o que estava ocorrendo, face o apontamento de ações o novo comprador só pagaria após a apresentação das certidões de objeto e pé, que como todo mundo sabe, nunca sai no prazo que a gente precisa.
Ou seja, a vendedora não tinha como pagar minha cliente e pedia para não depositar o cheque e um prazo suplementar de quinze dias, que eu sei muito bem que pode chegar a trinta dias ou mais.
A decisão não é minha, e se fosse eu faria cumprir simplesmente o que se estipulou na rescisão com todos os encargos pertinentes. Mais uma prova de que o mundo é redondo.
AC de Paula
Enviado por AC de Paula em 09/04/2015
Alterado em 09/04/2015
Pois ė assim, doutor...nunca devemos confiar mesmo em papéis assinados.
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